quarta-feira, 14 de março de 2012

14 de março - Dia Nacional da Poesia e do Vendedor de Livros


Paulo Leminsk

parem
eu confesso
sou poeta


cada manhã que nasce
me nasce
uma rosa na face


parem
eu confesso
sou poeta


só meu amor é meu deus

eu sou o seu profeta




Carlos Drummond de Andrade

Política Literária
A Manuel Bandeira 

O poeta municipal
discute com o poeta estadual
qual deles é capaz de bater o poeta federal.


Enquanto isso o poeta federal,
tira ouro do nariz. 




Simão Pessoa

Depois de comer aranha
minha cobra repousa murcha
numa infinita tristeza

Deito a amada de bruços
e minha cobra se levanta
para comer a sobremesa

             AKAI
          (1814-1862) 

Manuel Bandeira 

Estou farto do lirismo comedido
Do lirismo bem comportado
Do lirismo funcionário público com livro de ponto expediente
protocolo e manifestações de apreço ao Sr. Diretor.
Estou farto do lirismo que pára e vai averiguar no dicionário o
cunho vernáculo de um vocábulo.
Abaixo os puristas


Todas as palavras sobretudo os barbarismos universais
Todas as construções sobretudo as sintaxes de excepção
Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis


Estou farto do lirismo namorador
Político
Raquítico
Sifilítico
De todo lirismo que capitula ao que quer que seja fora
de si mesmo
De resto não é lirismo
Será contabilidade tabela de co-senos secretário
do amante exemplar com cem modelos de cartas
e as diferentes maneiras de agradar às mulheres, etc. 


Quero antes o lirismo dos loucos
O lirismo dos bêbados
O lirismo difícil e pungente dos bêbedos
O lirismo dos clowns de Shakespeare


- Não quero mais saber do lirismo que não é libertação. 


Marco Gomes 

poesia
tem que ter
cheiro de sangue
esperma e merda.
expressão de vida
nunca de sonhos.
poeta de quimera
tá morto, enterra.



Cecília Meireles

Motivo 


Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.

Irmão das coisas fugidias,

não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.

Se desmorono ou se edifico,

se permaneço ou me desfaço,
- não sei, não sei. Não sei se fico
- ou passo.

Sei que canto. E a canção é tudo.

Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
- mais nada.



Zemaria Pinto


exercício nº 13 (Also Sprach Zarathustra)


Agora vou dizer-vos sobre mim.
ó multidão destino e oceano.
Estai atenta para que as palavras
fundam-se em fogo e bronze na memória.

Dos homens ocos já trilhei caminhos,
plantei sementes de noturnos sonhos,
fiz-me passagem, ponte, travessia:
hoje sou ontem e amanhã e sempre.

Fui peregrino, traduzi montanhas,
levando em mim o caos que poderia
trazer à luz a mais brilhante estrela.

amei senão a alma transbordante
e a solidão dos poucos que souberam
viver a vida como se extinguindo. 



Marcileudo Barros

Estradas

Feito estradas de sonhos,
todos lindos.
Cobrem os raios do dia findo,
todo o chão.
Eu me ponho nessa estrada,
ar de domingo
a plantar e recolher
sonhos com a mão.

Feito fogos de artifício
coloridos.
Cobrem os raios do dia findo,
todo o chão
E eu me ponho nessa estrada,
entretido
a colher e espalhar brilhos com a mão.

Essa estrada é um sonho
e esse sonho
se acaba a cada novo despertar
Só as crianças e os poetas
nela vivem
Não dependem de dormir
para sonhar.


Hilda Hilst


ODE DESCONTÍNUA E REMOTA PARA FLAUTA E OBOÉ. DE ARIANA PARA DIONÍSIO.


(...)
                   X
Se todas as tuas noites fossem minhas
Eu te daria, Dionísio, a cada dia
Uma pequena caixa de palavras
Coisa que me foi dada, sigilosa

E com a dádiva nas mãos tu poderias
Compor incendiado a tua canção
E fazer de mim mesma, melodia.

Se todos os teus dias fossem meus
Eu te daria, Dionísio, a cada noite
O meu tempo lunar, transfigurado e rubro
E agudo se faria o gozo teu.



Celestino Neto

Bandeiras

Diz o ateu:
- Meu deus, quem diria?
anarquista funcionário público,
poeta marginal na Academia.

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